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ATROFIA MUSCULAR ESPINHAL – AME TIPO I - E AS NOVAS TERAPIAS MEDICAMENTOSAS SOBRE A LUZ DA LEGISLAÇÃO E DA JUSTIÇA


 Atrofia muscular espinhal – AME tipo I, é uma doença rara, de fundo genético, que acomete recém-nascidos, normalmente de cunho mórbido quando a criança alcança dois anos de idade. Seus malefícios são crescentes e vão afetando de forma lenta e persistente o sistema muscular, a dicção, a sucção, o movimento e a respiração, limitando assim os músculos e neurônios motores essenciais ao desenvolvimento do ser humano.

Assim vem descrito na página do Ministério da Saúde:

“O que é Atrofia Muscular Espinhal (AME)?
A Atrofia Muscular Espinhal (AME) é uma doença rara, degenerativa, passada de pais para filhos e que interfere na capacidade do corpo de produzir uma proteína essencial para a sobrevivência dos neurônios motores, responsáveis pelos gestos voluntários vitais simples do corpo, como respirar, engolir e se mover.
Varia do tipo 0 (antes do nascimento) ao 4 (segunda ou terceira década de vida), dependendo do grau de comprometimento dos músculos e da idade em que surgem os primeiros sintomas. 
Até o momento, não há cura para a Atrofia Muscular Espinhal (AME).” 

 Até o momento, frisa o entendimento Ministerial, não haveria cura para a doença. 
 Na medida em que os casos foram aumentando no mundo, de crianças acometidas desta doença, maiores foram os avanços em pesquisa dos grandes laboratórios e a busca pela cura da mesma. 

 Em 2017, houve o ingresso para registro de uma medicação chamada Nusinersena, cujo laboratório fabricante no Brasil é a empresa Biogen Brasil, junto a Anvisa, com nome industrial de Spinraza, assim descrito no site da Autarquia na época:

“Chega ao mercado brasileiro uma esperança para pessoas acometidas pela Atrofia Muscular Espinhal 5q (AME), doença que ataca o sistema nervoso até o ponto de o paciente não conseguir se mover ou mesmo respirar e que atinge um em cada dez mil bebês nascidos. A Anvisa publicará na segunda-feira (28/8) o registro do medicamento novo SPINRAZA® (nusinersena), na forma farmacêutica solução injetável e concentração de 2,4 mg/mL. Dessa forma, o Spinraza poderá ser comercializado no Brasil. A decisão será publicada no Diário Oficial da União (DOU).”
“O medicamento é indicado para o tratamento de pacientes com AME, doença rara neuromuscular autossômica recessiva de prognóstico adverso, caracterizada pela degeneração de neurônios motores da coluna vertebral e sem opções terapêuticas disponíveis no Brasil. O Spinraza é fabricado pelas empresas Vetter Pharma - Fertigung GmbH & Co. KG (Alemanha) e Patheon Itália S.PA (Itália). A detentora do registro do medicamento no Brasil é a empresa Biogen Brasil Produtos Farmacêuticos Ltda.”  

 Efetivamente, esta medicação era a única alternativa viável e eficaz para minimizar os estragos que a doença produz no organismo das crianças afetadas por esta rara moléstia. Tendo sido adotado e aprovado por praticamente todos os países no mundo, através de suas Agências Reguladoras na aprovação da medicação.

 Era na época, e ainda é até hoje, considerada uma medicação órfão no tratamento da doença, tendo sido liberada pelo Sistema Único de Saúde – SUS.

 Os valores envolvidos economicamente junto aos grandes laboratórios, que investem milhões de dólares na confecção e pesquisa destes medicamentos são enormes, o que em tese, justificaria o preço elevado de cada dose do remédio descoberto.

 Entretanto, a ciência é constantemente bombardeada por mais informações e avanços a cada dia. Uma descoberta impulsiona outra e assim sucessivamente a tecnologia avança de uma forma efetivamente impressionante, para o bem da humanidade.

 Mas o que seriam afinal as medicações órfãs? 

São todas as medicações singulares, para tratamento de doenças raras e que não encontram nenhum outro remédio similar, são, portanto, órfãos solitários no combate a estas doenças raras, específicas. Mas o que seriam as doenças raras? Assim nos aponta também o site da Anvisa:

“O que são doenças raras?
As doenças chamadas "raras" não têm cura e as opções terapêuticas disponíveis são restritas. Elas são definidas, de acordo com a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras, como aquelas que afetam até 65 pessoas em cada 100 mil indivíduos com base em dados oficiais nacionais ou, quando inexistentes, em dados publicados em documentação técnico-científica.” 

 E os medicamentos órfãos foram definidos pelo site Wikipédia a Enciclopédia Livre:

“O medicamento órfão é um status dado a medicamentos que tratam doenças raras por um órgão regulatório de saúde oficial do país. Para o FDA é considerado medicamento órfão aqueles que tratam de doenças que atingem menos de 200 000 americanos.[1] Para a União Europeia este tipo de medicamento são aqueles que atingem não mais do que cinco em cada 10 000 pessoas e as doenças tratadas com eles sejam crônicas debilitantes ou coloquem a vida em risco.[1] De acordo com a Anvisa os órfãos são indicados para incidência de doenças menor que 5 : 10 000.” 

 O Spinraza era considerado até bem pouco tempo o único medicamento capaz de minorar os efeitos nefastos desta doença, sendo aplicado, de regra, em quatro doses, três iniciais de quinze em quinze dias e outra após trinta dias. Seguindo após, um tratamento de uma aplicação a cada quatro meses por toda a vida do paciente. Como demonstra o site “A Tua Saúde”:

“Como usar”
“O uso de Spinraza só pode ser feito no hospital, por um médico ou enfermeiro, uma vez que é necessário injetar o remédio diretamente no espaço onde está a medula espinhal.

Normalmente, o tratamento é feito com 3 doses iniciais de 12 mg, separadas por 14 dias, seguida de outra dose 30 dias após a 3ª e 1 dose a cada 4 meses, para manutenção.” 

 Portanto, a medicação Spinraza, que o SUS oferece ao tratamento da doença AME, deve ser aplicada por toda a vida do paciente, e sem que se consiga obter a cura, mas apenas uma melhora significativa dos sintomas.

 O custo da medicação Spinraza, quando de sua regularização, era de R$ 420.000,00 (quatrocentos e vinte mil) a dose, mas após a regularização, em acordo comercial do Governo Brasileiro com o laboratório, o preço caiu para R$ 209.000,00 (duzentos e nove mil reais), conforme apontava na página do Ministério da Saúde:

“O Ministério da Saúde dará início ao processo de compra do medicamento Spinraza (nusinersen) para atender 13 ações judiciais. O fármaco é indicado para tratamento de atrofia muscular espinhal (AME), uma doença rara que atinge a coluna vertebral. Em um esforço do governo federal para regularizar a comercialização do produto no país, o seu registro teve prioridade na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para, em seguida, solicitar a definição de preço máximo”.
“O preço do medicamento oferecido ao Ministério da Saúde para o tratamento da AME era R$ 420 mil por ampola. Com a regularização, conseguiremos comprar por, no máximo, R$ 209 mil a ampola, uma redução de 50%. Essa economia representará maior eficiência dos gastos públicos e nos permitirá aplicar mais recursos na saúde”, declarou o ministro da Saúde, Ricardo Barros. O custo para tratar cada paciente chega a R$ 2,5 milhões. Uma das prioridades da atual gestão do Ministério da Saúde é minimizar e qualificar a oferta de medicamentos judicializados, buscando também alternativas que já estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS). Até o final deste ano, incluindo também estados e municípios, a previsão é de que o gasto com determinações judiciais em saúde, em 2017, chegue a R$ 7 bilhões. Só da União, deve ficar em R$ 1 bilhão.”  
    
Hoje, provavelmente, a medicação deva ser adquirida pelo SUS por um preço bem menor, mas deve girar em torno de cento e cinquenta mil reais cada dose. Entretanto, apesar do avanço desta medicação, o risco em sua aplicação é grande, uma vez que é feita no espaço onde se localiza a medula espinhal, acrescidos ainda do custo de internação a cada nova aplicação realizada (quatro no primeiro ano). A aplicação inicial do medicamento custa seiscentos mil reais, mais a necessidade de aplicação de três doses anuais por toda a vida do paciente. Se buscarmos uma expectativa de vida de quarenta anos a um paciente acometido da doença AME, temos que o custo total desta medicação, nos valores referidos, tomando a média de R$ 150.000,00 a dose, vão ficar no total em 18 milhões aos cofres públicos, sem incluirmos neste cálculo os custos hospitalares, de fisioterapia, de aparelho respiratório e outros decorrentes do tratamento dos sintomas da doença. 

Recentemente, houve a descoberta de um desdobramento do avanço tecnológico medicinal farmacológico para o AME, tendo sido apontado, a partir de 2019, um novo e eficaz medicamento que indica a cura da doença com apenas uma dose medicamentosa. Esta nova droga chama-se Zolgensma (Nusinersena) e trabalha, também com a genética, tendo sido desenvolvido inicialmente pelo laboratório Avexis e posteriormente sendo adquirida a sua patente pelo laboratório Novartis, que o comercializa em nível mundial.

Esta medicação se propõe a cura da doença AME – Atrofia Muscular Espinhal, Tipo I, que acomete os recém-nascidos. Este remédio, atualmente, é a medicação mais cara do mundo, seu preço atinge o valor de nove milhões de reais, ou dois milhões de dólares.

Com esta perspectiva milionária desta medicação, muitos dos pacientes acometidos desta doença viram suas esperanças ruírem frente a este quase impossível valor monetário. Por esta razão, desde o anúncio pelo laboratório da descoberta da cura desta doença rara (AME), houve um aumento da procura em demandas judiciais, direcionando ao Governo a obrigação do fornecimento do fármaco.

Recentemente, houve a aprovação do uso desta medicação pela FDA (Food and Drugs Administration) dos EUA, um correlato de nossa Anvisa e igualmente houve a sua indicação pela European Medicin e ainda o Japão, através de seu Ministro da Saúde. Portanto, grandes centros médicos e tecnológicos atestaram a validade da medicação ofertada, liberando a sua comercialização em seus países.

No Brasil, houve o ingresso do protocolo junto a Anvisa em 13.01.2020, iniciando os estudos e ensaios clínicos, ainda pendentes de uma regulamentação em nosso território Nacional.

Mas quem detém o drama da doença AME, não pode aguardar. Cada minuto de vida é uma espera terminativa e angustiante, pois esta nova medicação, só pode ser aplicada até a criança atingir os dois anos de idade, quando mais cedo aplicada melhor a resposta do organismo a medicação.

O número de ações junto ao Judiciário teve um considerado aumento de casos nos últimos anos, onde ainda existe muita desinformação sobre a doença, com carência de peritos especializados nesta patologia rara, nos efeitos da nova medicação e principalmente na aplicação desta nova medicina genética nas doenças raras no mundo. Estas dificuldades, enraizadas em um preconceito baseado em custo, em estudos médicos e principalmente em uma forma de aplicação da medicina nos moldes do século passado, muitos doentes, não conseguem reverter a sua situação trágica pelo Judiciário. Mas o aumento das demandas está trazendo uma nova luz ao entendimento Jurisprudencial.

Tivemos recentemente, uma reviravolta nas Decisões Judiciais impetradas no País, vindo nas duas concessões de Tutela de Urgência, em Decisões Monocráticas, ambas pelo Tribunal Regional Federal da 1º Região, lotado em Brasília, com as seguintes trechos:

Do Gabinete do Des. Federal Dr. Jirair Aram Meguerian:

PROCESSO: 1008072-90.2020.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 1011317-94.2020.4.01.3400 CLASSE: AGRAVO DE INSTRUMENTO 
“[...]”
“Não obstante reconheça ser inoportuno atribuir ao Ministério da Saúde o elevado gasto para aquisição do medicamento ora requerido, considerando o momento de controle da pandemia provocada pelo Novo Coranavírus, bem como pelo fato de que, não sendo o medicamento Zolgensma (Onasemngene Abeparvovec-xioi) registrado na ANVISA, não atende a um dos requisitos estabelecidos no REsp 1.657.156/RJ, submetido à sistemática de julgamento dos recursos repetitivos pelo Superior Tribunal de Justiça, ressalto que, a princípio, razão parece assistir à agravante, pelo que deve, por ora, ser reformada, data maxima venia do entendimento contrário, a r. decisão agravada.”
“Isso porque, em circunstâncias como a que ora se examina, não se pode deixar de lado a sua situação excepcional da recorrente, de apenas 1 ano e 4 meses, diagnosticada com Atrofia Muscular Espinhal Tipo I, necessitando se submeter ao tratamento com o fármaco pleiteado antes que complete 2 anos de idade, o que ocorrerá no dia 03/11/2020 (Id 186375364 dos autos de origem).”
“[...]”

“Ressalto, por fim, que ainda que elevadíssimo o valor do medicamento ora pleiteado (Zolgensma), de aproximadamente 9 milhões de reais, é uma medicamento de dose única, que, se comparado ao medicamento Spinraza, que é disponibilizado pelo SUS, cuja dose custa aproximadamente R$ 364.000,00, (Id 186375385 dos autos de origem) e é de uso contínuo por toda a vida do paciente portador de AME, é o que possui melhor custo/benefício, já tendo a agravante recebido 6 doses de Spinraza e necessitará receber 1 dose a cada 4 meses pelo resto da vida, conforme o laudo médico Id 186375367.”
“Assim, com essas considerações vislumbro presente a verossimilhança das alegações e o perigo da demora a justificar, em caráter excepcional, a concessão do medicamento ora pleiteado. Pelo exposto, DEFIRO, por ora, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela recursal e determino o imediato fornecimento do medicamento Zolgensma (Onasemngene Abeparvovec-xioi), na forma da prescrição médica.” 
“Oficie-se, com urgência, ao Juízo a quo, encaminhando-lhe cópia desta decisão para conhecimento e cumprimento. 
“Publique-se. Intime-se a agravada, facultando-lhe apresentar contraminuta no prazo legal (art. 1.019, II, CPC/2015). “
B”rasília/DF, data da assinatura eletrônica. “
“JIRAIR ARAM MEGUERIAN Desembargador(a) Federal Relator(a)”

Do Gabinete do Des. Federal Dr. Daniel Paes Ribeira, por Decisão do Juiz Convocado Dr. Roberto Carlos de Oliveira:

AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) n. 1012018-70.2020.4.01.0000 PROCESSO REFERÊNCIA: 1043565-50.2019.4.01.3400.
“[...]”
“No que concerne a possibilidade de fornecimento do medicamento, que não se
encontra registrado perante a ANVISA, cito o Tema 500 do STF, julgado em regime de repercussão geral, posto no sentido de que, "é possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei no 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i)a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras); (ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil.”
“As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União”, uma vez que atendidos os requisitos ali consignados.”
“Ante o exposto, defiro o pedido de tutela de urgência para, reformando a decisão
agravada, determinar que seja fornecido o medicamento Zolgensma (Onasemngene Abeparvovec-xioi), na forma da prescrição médica.”
“Destaque-se que a presente decisão substitui aquela proferida em 1a instância, assim, o respectivo cumprimento da medida deverá se dar no âmbito do processo originário.”
“Comunique-se, com urgência.”
“Intime-se a parte contrária para apresentar resposta ao recurso.”
“Publique-se.
Brasília, 4 de maio de 2020.
Juiz Federal ROBERTO CARLOS DE OLIVEIRA
Relator convocado”

Decisões de suma importância, que entenderam a singularidade da doença AME, a precocidade dos infantes acometidos deste mal, e a necessidade da urgência medicamentosa, ultrapassando as questões burocráticas e institucionais.

DO DIREITO CONSTITUCIONAL A SAÚDE:

 O embasamento teórico da questão vem alicerçado na premissa que a saúde é direito de todos e obrigação do Estado, presente nos art. 196 e art. 200, I, II, V da CF, a saber:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: 
I – controlar e fiscalizar procedimentos, produtos e substâncias de interesse para a saúde e participar da produção de medicamentos, equipamentos, imunobiológicos, hemoderivados e outros insumos;
II – executar as ações de vigilância sanitária e epidemiológica, bem como as de saúde do trabalhador;
V – incrementar em sua área de atuação o desenvolvimento científico e tecnológico;

 A obrigação do Estado na concessão da medicação, veio da própria história do sistema de saúde Brasileiro, baseado em sua evolução e também eficácia.

 Neste sentido, todos têm direito ao acesso à saúde, ainda que isto soe contraditório e utópico. 

 Baseados nesta premissa Constitucional estaria o cerne do direito das partes, acometidos de uma doença rara, sem cura e com baixa expectativa de vida do infante, somados ainda a necessidade de um sistema de manutenção de terapias, respiradores e todo um acesso paralelo de atividades para manutenção da vida das crianças, neste curto período. 

DA APLICAÇÃO DE MEDICAÇÃO ÓRFÃO 
AINDA SEM REGISTRO E A DECISÃO DO STF

 Existem vários processos em andamento e alguns já com julgamento selado quanto à decisão em relação aos medicamentos órfãos e doenças raras com a obrigação do Estado em fornecer, como se observa na decisão do Recurso Especial 657718:

Decisão: O Tribunal, apreciando o tema 500 da repercussão geral, deu parcial provimento ao recurso extraordinário, nos termos do voto do Ministro Roberto Barroso, Redator para o acórdão, vencidos os Ministros Marco Aurélio (Relator) e Dias Toffoli (Presidente). Em seguida, por maioria, fixou-se a seguinte tese: "1. O Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamentos experimentais. 2. A ausência de registro na ANVISA impede, como regra geral, o fornecimento de medicamento por decisão judicial. 3. É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento sem registro sanitário, em caso de mora irrazoável da ANVISA em apreciar o pedido (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016), quando preenchidos três requisitos: (i) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (salvo no caso de medicamentos órfãos para doenças raras e ultrarraras);(ii) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e (iii) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil. 4. As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União”, vencido o Ministro Marco Aurélio. Ausente, justificadamente, o Ministro Celso de Mello. Plenário, 22.05.2019.

 Com esta Decisão de Repercussão Geral feita pelo Supremo Tribunal Federal, entendemos que houve uma abertura para a possibilidade de indicação de medicação, demonstrando uma conexão com o mundo, em respeito a decisões de outros países e suas agências reguladoras e o reconhecimento das medicações órfãs para tratamento de doenças raras.

CONCLUSÃO:

 A doença AME acomete milhares de crianças no mundo, carecendo ainda de uma estatística confiável, havendo no Brasil muito mais do que cento e cinquenta crianças acometidas desta doença, que se tem conhecimento.

 Os avanços tecnológicos remeteram a descobertas cada vez melhores em termos de eficácia e caminhando para a sua cura.

 O primeiro medicamento (Spinrasa), que já é disponível pelo SUS, foi revolucionário e ainda hoje é o utilizado para melhorar os sintomas terríveis da doença. Infelizmente, não havia ainda uma medicação que pudesse caminhar para a cura da doença.

 Recentemente descoberto, a medicação Zolgensma (onasemnogene abeparvovecxioi) se propõe a cura da doença AME, mas por ser uma medicação órfão, seu valor de mercado ainda é bastante caro, importando em medo e insegurança no seu fornecimento. Por ser também uma medicação nova, ainda não se encontra liberado no Brasil ou em outros centros médicos, mas já com liberação em alguns grandes centros, como nos EUA, Japão e a Agência Europeia de Medicamentos.

 Verificamos que existe ainda uma necessidade muito grande de uma abertura maior no entendimento de aplicações e políticas públicas no Brasil. A liberação e acesso de novas drogas, principalmente em doenças raras, são necessárias e devem contar com o apoio dos Governos, pois desta forma, haverá uma caminho mais facilitado à pesquisa, desenvolvimento e comercialização de novos e melhores medicamentos.

 A judicialização na busca da saúde é um problema crescente no País, considerando que as políticas públicas de saúde, ainda são muito precárias e burocráticas em nossa terra. Ainda estamos muito submersos em interesses comerciais, em lucros demasiados, com baixíssimo investimento em pesquisas com real eficácia. Tudo isto conspira para a falta de luz na concessão, avaliação e liberação dos medicamentos órfãos ao tratamento de doenças raras.

O único caminho restante a população que ainda tem acesso à Justiça, é buscar a garantia da saúde, através do Judiciário, e em hipótese alguma vemos isso como prejudicial, pois enquanto esbarrarmos em precários e burocráticos caminhos na obtenção da saúde, a judicialização é uma medida muito bem vinda, inclusive funcionamento como um marco orientador as políticas públicas e de saúde da população.

A falta ou não de recursos no sistema de saúde Nacional, é uma verdade muito relativa, baseada em dados nem sempre claros e muito das vezes ineficientes e incompletos, para mapear a realidade do País. Em verdade, se observa a aplicação de valores efetivamente superiores em artifícios supérfluos e destinado a uma pequena casta social, quase sempre o andar de cima, o topo da pirâmide. 

A cura da doença AME, caminha para a sua conclusão, através de estudos preliminares que demonstram a eficácia da medicação Zolgensma. Sua maior limitação é a aplicação em crianças antes de completarem dois anos de idade. Em termos de judicialização, este tempo pode ser muito restrito, e ficamos processualmente com a alternativa das Tutelas de Urgência e das Decisões Monocráticas para salvar vidas. É pouco, mas é um caminho a ser pensado e aplicado pela Justiça, visando alcançar um fim útil do processo e porque não afirmar: um bem comum com progresso social.

Porto Alegre, 12 de maio de 2020.

Eduardo Medina Guimarães.
OAB RS 42 500

Sobre o autor:
 Advogado, Escritor e Artista Plástico, Membro da Comissão de Defesa dos Advogados do Brasil Seccional do Rio Grande do Sul CDAP, proprietário da Medina Guimarães Advocacia, com atuação focada no Direito Médico e do Consumidor.
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